fbpx

Dra. Ana Beatriz Barbosa Silva

Alotriofagia: Quando comer o incomum se torna um sinal de alerta

Alotriofagia Quando comer o incomum se torna um sinal de alerta

Introdução:

Você já ouviu falar de pessoas que sentem vontade de comer coisas como gelo, barro, papel, sabão ou cabelo? Isso pode parecer estranho, mas existe um nome para esse comportamento: Alotriofagia. Esse transtorno alimentar é mais comum do que se imagina e pode trazer riscos reais à saúde. Neste texto, vamos entender o que é a Alotriofagia, quais suas causas, riscos, como é feito o diagnóstico e quais os tratamentos disponíveis.

O que é Alotriofagia?

A Alotriofagia é caracterizada pelo desejo persistente e compulsivo de ingerir substâncias não nutritivas, por um período superior a um mês, em uma intensidade incompatível com o desenvolvimento normal da pessoa. Entre os itens mais comuns ingeridos estão:

  • Gelo (pagofagia)
  • Terra ou argila (geofagia)
  • Cabelo (tricofagia)
  • Papel, sabão, giz, cola, cinzas ou plástico

Embora possa ocorrer em qualquer idade, é mais frequentemente observada em crianças, gestantes e pessoas com deficiência intelectual ou transtornos psiquiátricos.

Causas 

A origem pode envolver diversos fatores:

  • Deficiências nutricionais, como falta de ferro ou zinco, que alteram o apetite e levam o organismo a buscar compensações incomuns;
  • Gravidez, especialmente no primeiro trimestre, devido às alterações hormonais e carências minerais;
  • Transtornos mentais, como autismo, esquizofrenia ou transtorno obsessivo-compulsivo (TOC);
  • Fatores culturais, onde certos hábitos alimentares são vistos como tradicionais ou espirituais;
  • Negligência, abuso ou ambientes com falta de estímulos, especialmente em crianças.

É importante ressaltar que a ingestão ocasional de objetos estranhos por crianças pequenas pode ser normal, mas torna-se um problema quando é frequente, persistente e compulsivo.

Riscos 

Ingerir substâncias não comestíveis pode gerar sérios riscos físicos e mentais, como:

  • Intoxicações e envenenamentos
  • Obstruções ou perfurações intestinais
  • Infecções por parasitas ou bactérias (no caso de terra, por exemplo)
  • Problemas dentários e gastrointestinais
  • Desnutrição, quando a ingestão dessas substâncias substitui alimentos nutritivos

Além dos danos físicos, a pessoa com Alotriofagia também pode enfrentar vergonha, isolamento social e dificuldades emocionais por não entender ou conseguir controlar esse impulso.

Diagnóstico 

O diagnóstico é clínico e deve ser feito por um médico ou psicólogo, com base nos critérios do DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais). Ele considera:

  • A persistência do comportamento por pelo menos 1 mês;
  • A ausência de explicações culturais ou religiosas para o ato;
  • A exclusão de causas médicas ou desenvolvimento infantil típico (no caso de crianças pequenas).

Podem ser solicitados exames laboratoriais para verificar deficiências nutricionais ou detectar danos causados pela ingestão de substâncias inapropriadas.

Tratamento 

Atualmente, não há um tratamento padronizado para a Alotriofagia. Em geral, os cuidados são individualizados, adaptados às necessidades específicas de cada pessoa. O tratamento costuma envolver uma abordagem integrada, com a atuação conjunta de médicos, psicólogos e outros profissionais da saúde.

Na prática clínica, costumam-se considerar três aspectos principais: a correção de possíveis deficiências nutricionais; a realização de psicoterapia e o uso de medicamentos, especialmente os inibidores seletivos da recaptação da serotonina. Esses fármacos são indicados quando há a presença de outros transtornos psiquiátricos associados, como depressão, transtorno obsessivo-compulsivo ou transtornos de ansiedade.

A orientação familiar também é fundamental, especialmente nos casos infantis, ajudando a monitorar comportamentos e estimular alternativas saudáveis.

Conclusão:

A Alotriofagia é um transtorno real, que pode trazer sérios riscos à saúde e que não deve ser ignorado ou tratado com julgamento. Com o diagnóstico certo e o tratamento adequado, é possível controlar o impulso e recuperar a saúde física e emocional da pessoa afetada.

Falar sobre isso com empatia e informação é o primeiro passo para transformar o desconforto em cuidado e o silêncio em acolhimento.

Referências

American Psychiatric Association. (2013). DSM-5: Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais.
Ali, Z., & Bhatti, M. A. (2021). Pica: An age-old eating disorder. BMJ Case Reports.
Rose, E. A., & Porcerelli, J. H. (2009). Pica: Common but commonly missed. American Family Physician.
Nayar, R. (2020). Pica in children: Diagnostic and treatment strategies. Pediatrics in Review.

Dra. Ana Beatriz Barbosa

Dra. Ana Beatriz Barbosa

Médica graduada pela UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) com residência em psiquiatria pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Compartilhe nas mídias:

Comente o que achou:

Back to top:

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Ao clicar em ¨Aceitar¨ você concorda com o uso dos cookies, termos e políticas do site.