fbpx

Dra. Ana Beatriz Barbosa Silva

Feminicídio: A Face Mais Cruel da Violência de Gênero

Feminicídio A Face Mais Cruel da Violência de Gênero

Introdução

O feminicídio é mais do que um assassinato. É o desfecho trágico de uma cultura que naturaliza o controle, a dominação e a desvalorização da mulher. Quando uma mulher é morta apenas por ser mulher, estamos diante de uma das expressões mais extremas e alarmantes da violência de gênero. E, infelizmente, essa realidade não é rara — ela é cotidiana.

Apesar dos avanços legais e sociais, milhares de mulheres ainda perdem a vida em contextos de relacionamento abusivo, machismo estrutural e omissão institucional. O feminicídio não surge do nada: ele é precedido por ciclos de abuso, ameaças, agressões e silêncio. Entender suas raízes, identificar os sinais e fortalecer políticas de proteção são passos urgentes para mudar essa triste estatística.

Neste artigo, vamos refletir sobre o que é o feminicídio, suas causas, como identificá-lo, o que a lei brasileira diz e, principalmente, como prevenir esse tipo de crime através da conscientização e da ação coletiva.

O Que é Feminicídio?

Feminicídio é o assassinato de uma mulher motivado por razões de gênero. Isso significa que a vítima é morta por ser mulher, em um contexto de desigualdade, posse ou desprezo. A Lei nº 13.104/2015, conhecida como Lei do Feminicídio, alterou o Código Penal brasileiro para incluir esse crime como uma forma qualificada de homicídio.

O feminicídio pode acontecer em diferentes cenários, sendo os mais comuns:

  • Feminicídio íntimo: cometido por parceiro ou ex-parceiro, geralmente após um histórico de violência doméstica.
  • Feminicídio não íntimo: cometido por alguém com quem a vítima não tinha relação, mas onde o motivo ainda está relacionado ao desprezo pela condição feminina.
  • Feminicídio por discriminação: contra mulheres trans, lésbicas ou que desafiam normas sociais patriarcais.

Feminicídio x Homicídio Comum

Diferente do homicídio comum, o feminicídio tem como motivação o gênero. Ou seja, a mulher é morta por estar em uma posição de vulnerabilidade dentro de uma estrutura machista. Não é apenas um crime individual — é um sintoma de uma sociedade que ainda legitima o controle do corpo, da voz e da vida da mulher.

Principais Causas do Feminicídio

1. Machismo estrutural

Desde cedo, homens e mulheres são educados em uma cultura que naturaliza o poder masculino sobre o feminino. O controle, o ciúme, a posse e a violência são, muitas vezes, confundidos com “amor”.

2. Violência doméstica

O feminicídio costuma ser o último estágio de um ciclo de abuso que começa com controle psicológico, passa pela agressão física e termina com o assassinato. Muitas vítimas tentaram denunciar ou sair da relação, mas não foram protegidas.

3. Falta de políticas públicas eficazes

A ausência de acolhimento rápido, casas de abrigo, rede de apoio psicológico e assistência jurídica torna a vítima ainda mais vulnerável.

4. Impunidade

A sensação de que “nada vai acontecer” para o agressor faz com que muitos crimes sejam repetidos. O medo da denúncia, aliado à morosidade do sistema, favorece a continuidade da violência.

Dados Alarmantes no Brasil

O Brasil está entre os países com maior número de feminicídios do mundo. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública:

  • Uma mulher é vítima de feminicídio a cada 6 horas.
  • A maioria dos crimes ocorre dentro de casa.
  • Mulheres negras representam a maioria das vítimas.
  • Em muitos casos, o agressor já havia sido denunciado anteriormente.

Esses dados revelam que o feminicídio é evitável — desde que haja ação rápida, proteção efetiva e responsabilização dos agressores.

Sinais de Alerta: Como Identificar o Risco

A maioria dos feminicídios é precedida por sinais claros, como:

  • Controle excessivo do parceiro
  • Agressões verbais, ameaças e insultos
  • Isolamento da vítima de amigos e familiares
  • Agressões físicas anteriores
  • Tentativas de denúncia frustradas
  • Frases como “se não for minha, não será de ninguém”

Identificar e agir diante desses sinais é essencial para salvar vidas.

Como a Sociedade Pode Prevenir o Feminicídio

1. Denúncia e escuta ativa

Ao identificar uma mulher em situação de risco, ofereça apoio, não julgamento. Incentive a busca por ajuda e denuncie, se necessário. No Brasil, o número 180 é um canal de denúncia nacional e anônimo.

2. Educação para a igualdade

É preciso educar meninos e meninas desde cedo sobre respeito, consentimento, autonomia e equidade de gênero.

3. Fortalecimento de redes de apoio

Delegacias especializadas, centros de acolhimento e grupos de apoio psicológico devem ser acessíveis e funcionais.

4. Punição dos agressores

A impunidade é um dos maiores combustíveis da violência. A aplicação rigorosa da lei e o fim da cultura de conivência são fundamentais.

5. Apoio emocional às vítimas

Oferecer escuta, apoio psicológico e orientação é tão importante quanto a ação legal. Muitas mulheres permanecem na violência por medo ou solidão.

Conclusão

O feminicídio é o reflexo mais cruel de uma sociedade que ainda falha em proteger, respeitar e valorizar a vida das mulheres. Cada caso é uma tragédia anunciada, uma vida interrompida, uma história que poderia ter tido outro fim.

Romper esse ciclo exige mais do que leis: exige mudança de mentalidade, ação coletiva e coragem para desconstruir o machismo que ainda se esconde em tantos gestos cotidianos. Nenhuma mulher deve morrer por tentar ser livre. Nenhuma deve viver com medo de ser quem é.

Referências

  1. Lei nº 13.104/2015 – Lei do Feminicídio, Brasil.
  2. Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Anuário da Violência Contra a Mulher (2023).
  3. ONU Mulheres – Feminicídio: entender para prevenir.
  4. Waiselfisz, J. J. (2015). Mapa da Violência: Homicídio de Mulheres no Brasil.
  5. Saffioti, H. I. B. (2004). Gênero, Patriarcado e Violência.
Dra. Ana Beatriz Barbosa

Dra. Ana Beatriz Barbosa

Médica graduada pela UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) com residência em psiquiatria pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Compartilhe nas mídias:

Comente o que achou:

Back to top:

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Ao clicar em ¨Aceitar¨ você concorda com o uso dos cookies, termos e políticas do site.